quinta-feira, 15 de junho de 2017

Zooilógicos


Há uma localidade chamada Campos Verdes que faz parte da cidade de Laguna. O lugar fica mais ou menos há 10 quilômetros do centro. Não sei como é hoje, mas na minha infância era um local onde a grande maioria dos moradores vivia da pesca artesanal. 



Seu comércio se resumia há alguns botecos e alguns poucos mercadinhos que eram chamados de vendas. Normalmente os terrenos eram relativamente grandes e com mais de uma casa, quase sempre de madeira. Estradas de pouquíssimo movimento sem calçamento ou asfalto; raramente se via um carro. 



Meus avôs paternos moravam em um desses terrenos. A pequena casa de madeira era bastante simples, mas eu adorava passar alguns dias lá. No quintal, além das árvores frutíferas, bambuzais e muita grama, havia também muitos patos, marrecos, galinhas, pássaros e um cachorro. 



Para mim era uma festa ver minha vó alimentar suas aves. Bastava sair na rua com um saco de milho ao mesmo tempo em que gritava "pi pi pi pi pi", que logo era cercada por uma boa quantidade de animais. Em minha casa não havia um terreno tão espaçoso e muito menos tantos bichos. 



Aquele para mim era um momento único. A iluminação pública de Campos Verdes era bastante precária e a casa ficava longe da estrada. Ao anoitecer, a escuridão só não era total por causa dos vaga-lumes que surgiam. O silêncio só era quebrado quando alguma ave sobrevoava o quintal emitindo algum som. 



O único momento triste ficava por conta de quando eu via minha vó sacrificar algum animal para o almoço. Ainda criança, já tinha visto todo tipo de bicho doméstico. Animais selvagens, somente pela televisão ou quando algum circo chegava na cidade, mas os magros e judiados animais não se pareciam em nada com aqueles da TV. Aos doze anos tive a oportunidade de visitar o zoológico de São Paulo. Por algum motivo que desconhecia, a experiência não havia sido tão marcante como eu esperava. 



Já na vida adulta, visitei um zoológico catarinense e uma cena ficou gravada em minha mente. Fui ao local onde estava o urso e vi o animal sobre uma espécie de palanque caminhando repetidamente de um lado para o outro. Com pouca bateria na máquina, fiz uma curta filmagem. Alguns anos depois revendo fotos e vídeos e novamente assistindo a cena, resolvi pesquisar sobre aquele comportamento. Em um site especializado, li que animais que se comportam daquele jeito estão com um nível altíssimo de estresse por conta do confinamento. No momento em que li esta informação decidi não mais visitar zoológicos. 



Meu contato com animais atualmente restringe-se a morar com minha cadelinha, ver os animais que encontro em minhas andanças pela natureza e também apreciar os beija-flores e as cambacicas que vêm beber a água que preparo para eles aos finais de semana. 



Estes últimos aliás, chegam a pousar na mesa enquanto tomo café da manhã e um deles inclusive já pousou em minha mão. Há quem diga que certos animais se aproximam de nós por conta da comida. Eu penso que além da comida, eles procuram carinho e respeito, coisas que fazem com que estes queridos irmãos percam o receio e se aproximem cada vez mais da nossa raça.


domingo, 4 de junho de 2017

A Luz Por Trás da Escuridão


Desde o início da vida, pouco tempo depois de nascermos, aprendemos que tudo tem um fim, inclusive que a própria vida neste mundo em algum momento acabará. Mesmo com esta consciência, fazemos disto o que há de pior a nos acontecer. Tememos pelo fim e lutamos com todas as forças para evitar a sua chegada. Lembro que no final de 2006 ou 2007 - não tenho bem certeza quanto ao ano - recebi a notícia de que um colega de trabalho havia sofrido um enfarte. Embora fosse uma pessoa que estava sempre em um altíssimo astral, eu vinha notando nos últimos meses que seu semblante já não era mais o mesmo, assim como o seu comportamento. Semanas depois de ter sobrevivido ao sério problema de saúde, ele retornou ao trabalho e durante uma conversa que tivemos sobre o que havia acontecido, o colega relatou a situação em detalhes para mim surpreendentes. Disse que simplesmente "apagou" enquanto estava no hospital para ser atendido. Disse ainda que algum tempo depois começou a ver toda a movimentação à sua volta e as tentativas de reanimação; tudo isso como se estivesse vendo do teto da sala hospitalar. Isso mesmo, estava vendo de cima os profissionais tentando fazer o seu corpo voltar à vida. Ele mostrou as marcas no peito deixadas pelo uso do desfibrilador e falou com o velho bom humor que aquela havia sido uma experiência chocante. Em 2015 meu filho contou que o avô de seu amigo também sofreu um enfarte e que também passou por uma experiência daquilo que muitos chamam de quase morte. No relato, o sobrevivente disse que após ver uma luz intensa esteve em um lugar muito agradável e de muita paz. Já em abril deste ano, estive visitando meus sogros e ouvi a história sobre um tio de minha esposa que está com sérios problemas de saúde e que os médicos consideram ser irreversível. Na época muito se falou da preocupação dele com relação à morte. Ontem fiquei sabendo que durante a última semana o mesmo também passou por uma experiência de quase morte. Conforme seu relato, também após a visão de uma forte luz, ele esteve em um lugar tão maravilhoso, de tanta paz e tanta beleza, que se a morte for tudo aquilo que viu, deseja que o fim chegue logo. Com base nessas histórias e refletindo sobre o assunto, tenho a sensação de que o que faz o medo não é a morte em si, mas sim, o desligamento em relação a tudo o que criamos ou conquistamos como emprego, projetos, família e amigos. 


O sofrimento que nos leva até ao fim da vida como as doenças que tanto nos maltratam e nos impedem de fazer aquilo que gostamos, talvez seja a pior das experiências. Por isso é que talvez tenhamos que buscar viver de forma mais intensa sob qualquer situação. Abraçar com vontade, curtir a beleza de um dia de sol, enxergar a beleza da chuva, reconhecer o verdadeiro valor das coisas, principalmente das mais simples. Me perguntam se eu não me incomodo em comer a comida fria que levo pronta de casa para o trabalho e como no carro durante o almoço. Eu respondo que existem muitas coisas que criamos em nossa mente como por exemplo, que a comida tem que ser quente ou fria, doce ou salgada, mas que quando a fome é realmente forte nada disso importa. Digo ainda que a causa que me faz optar por este tipo de alimentação é o tempero que dá sabor às minhas refeições. Se soubermos usar nossa mente, podemos alcançar feitos incríveis e a ciência vêm provando isso a cada dia. Então, saibamos nos livrar dos rótulos e das regras que criamos para tudo e identifiquemos em nós mesmos as possibilidades de fazermos coisas aparentemente sem graça se tornarem algo excelente. Aprendamos a reconhecer o privilégio de ter o que comer independentemente do que for, sempre ao sentar à mesa. Ainda que possa ser chato por tê-lo como obrigação, mas que é uma necessidade conforme o mundo que moldamos, reconheçamos que é bom ter um emprego enquanto muitos estão perdendo os seus. Lembremos da importância de ao final do dia, ao chegar em casa, termos uma família para abraçar, enquanto muitos vivem solitários ou não têm uma boa relação com as suas. Aprendamos que entre os temperos que dão sabor à vida, não estão os excessos, mas sim , o essencial para se viver bem. O céu e o inferno estão em nós mesmos e a consciência sobre nossos atos é que nos levarão a um ou a outro. A vida não cessa e a matéria também não, ela apenas se transforma.